Gerente – Papel e Práticas – parte 1

O papel gerencial da liderança

Quando falamos de liderança, normalmente, enaltecemos a figura daquele que é visionário, que inspira as pessoas a se dedicarem em prol de um objetivo comum. Esse tipo de gestor, nós chamamos de líder.

Os que não conseguem tal proeza, nós chamamos de chefes. Aquela figura burocrática e autoritária, que não desperta nas pessoas um interesse genuíno de contribuir, apenas cobra melhores resultados, controla processos e não admite que algo saia errado.

Como discutimos em outro momento, a definição de líder ou chefe não passa de uma questão de perspectiva. Porém, no meio desse jogo de segregação da liderança – que na verdade é apenas fruto da nossa mania de dar nomes para as coisas – existe uma figura real e muito importante:

Aquele que executa, que faz as coisas acontecerem, que define exatamente o que cada um precisa fazer, para que a visão de uma empresa se torne realidade.  No post de hoje, vamos entender um pouco melhor o papel do Gerente.

A evolução do gerente

Entender quais são as atribuições de um gerente não é tarefa simples, o papel e o trabalho gerencial são temas centrais no estudo da administração há muito tempo.

De acordo com Maximiano, o provável estudioso mais antigo da gerência foi o historiador romano Plutarco, que viveu entre os anos 46 e 120 e estudou biografias de governantes, como César, Alexandre, Rômulo e Teseu.

Depois de Plutarco, inúmeros historiadores, filósofos e cientistas dedicaram-se a estudar, entender e fazer proposições para a atuação dos gerentes. Um dos mais importantes foi o francês Henri Fayol (1841 – 1925), influente pensador, que está sempre presente nas aulas e livros de administração.

Para Fayol, em uma empresa organizada, seus colaboradores necessitam saber o que fazer, suas ações precisam de coordenação e suas tarefas precisam de controle gerencial. Segundo ele, para assegurar um desempenho satisfatório nesse papel, o gerente deveria seguir 16 deveres básicos:

  1. Assegurar a cuidadosa preparação dos planos e sua rigorosa execução.
  2. Cuidar para que a organização humana e material seja coerente com o objetivo, os recursos e os requisitos da empresa.
  3. Estabelecer uma autoridade construtiva, competente, enérgica e única.
  4. Harmonizar atividades e coordenar esforços.
  5. Formular as decisões de forma simples, nítida e precisa.
  6. Organizar a seleção eficiente de pessoal.
  7. Definir claramente as obrigações.
  8. Encorajar a iniciativa e o senso de responsabilidade.
  9. Recompensar justa e adequadamente os serviços prestados.
  10. Usar sanções contra faltas e erros.
  11. Manter a disciplina.
  12. Subordinar os interesses individuais ao interesse geral.
  13. Manter a unidade de comando.
  14. Supervisionar a ordem material e humana.
  15. Ter tudo sob controle.
  16. Combater o excesso de regulamentos, burocracia e papelada.

Alguns desses deveres podem fazer o gestor atual se contorcer na cadeira, mas devemos lembrar que, naquela época, Fayol e seus seguidores consideravam a empresa como um sistema racional de regras e autoridade. Nesse contexto, o papel do gerente era próximo ao que, hoje em dia, atribuímos ao “chefe”. 

As contribuições de Fayol foram de extrema relevância e muitos de seus ensinamentos se perpetuam até hoje, porém, os deveres dos gerentes foram constantemente revisados ao longo da história.

Um autor que contribuiu bastante com essa evolução foi Chester Barnard, presidente da Fundação Rockfeller e professor de Harvard em 1937, o qual contestou parte da teoria de Fayol, ao afirmar:

“Os gerentes devem estar conscientes de que dependem dos subordinados para implementar suas decisões. O gerente prudente não emite ordens que ele sabe que serão rejeitadas por sua equipe. O conceito tradicional da autoridade deve ser revisto, porque a aceitação das ordens é crítica para a eficácia do gerente.”

Barnard acrescentou que o essencial do trabalho gerencial não era dirigir pessoas, mas que elas fossem autogeridas no trabalho em regime de cooperação. Segundo Maximiano, em resumo, as funções do gerente de Barnard abrangem três possibilidades principais:

  1. Desenvolver um sistema de comunicação com a organização informal, como estratégia para possibilitar a eficácia da organização formal.
  2. Promover a formação e manutenção de um sistema de recursos humanos, incluindo a motivação das pessoas, por meio de incentivos eficazes.
  3. Formular e definir os propósitos, objetivos e fins da organização, o que inclui a doutrinação dos funcionários operacionais com os propósitos gerais e as grandes decisões.

As contribuições de Barnard refletem um período de ruptura, em que se iniciava a tendência de atribuírmos maior valor aos “líderes do que aos “chefes“.

No início dos anos 70, outra grande contribuição para esse movimento foi oferecida pelo professor canadense Henry Mintzberg. Com base em seus estudos de doutoramento no MIT,  também questionou a ideia de Fayol, alegando que os gerentes têm “outras responsabilidades além do desempenho das funções do processo administrativo.”

Segundo Mintzberg, os gerentes são fortemente orientados à ação e suas atribuições podem ser divididas em 3 categorias:

  • Informacional – Supervisionar o ambiente e processar informação constituem uma parte central de seu trabalho. Eles monitoram o que está acontecendo, disseminam o que descobrem e agem como porta-vozes da empresa.
  • Interpessoal – A informação é de fácil acesso ao gerente, porque a sua posição o conecta a muitas pessoas. Nesse sentido, atuam como ponto de ligação entre um grande grupo de pessoas e departamentos.
  • Decisório – O terceiro papel do gerente é o de tomar decisões. Ele tem que supervisionar e alocar os recursos financeiros, materiais e pessoais. Além disso, deve encorajar a inovação e buscar conciliação e pacificação, quando a empresa sofre uma perturbação ou transformação inesperada.

Para Mintzberg, a gestão é uma prática na qual a arte, ciência e ofício se encontram:

“A gestão é complexa e contraditória em suas demandas, sendo tanto baseada em intuição, julgamento e agilidade intelectual quanto em habilidade técnica, planejamento e lógica científica. Todos esses elementos se unem quando os gerentes planejam, monitoram e desenvolvem o jeito como as coisas são feitas.”

E, assim, saímos de uma definição mais próxima daquilo que conhecemos como “chefe”, para nos aproximarmos muito mais das atribuições de um “líder”. Não seria esse, portanto, o papel de um gerente atual?

Gerente x Líder

Realmente, na atualidade, o gerente possui atribuições que poderiam lhe dar o título informal de líder. Mas, isso não é uma regra, na verdade, gerenciar e liderar são atividades distintas:

“Os bons gerentes nem sempre são os melhores líderes, assim como bons líderes podem ser maus gerentes. Gerentes fazem o que é certo; líderes fazem a coisa certa.

A frase acima foi escrita em 1985, por Warren Bennis e Burt Nanus (apesar de muitas vezes ser atribuída a Peter Drucker), segundo eles, é prática comum em várias empresas privilegiar a liderança em detrimento da gerência, mas isso não é inteligente.

As grandes organizações valorizam os dois: líderes que vislumbram oportunidades e gerentes que permitem que tais oportunidades se tornem realidade:

“Um gerente eficiente é fundamental para o sucesso de uma organização. Sem a gerência, não importa se os líderes estão cumprindo seu papel, uma organização desmonta num caos desorganizado.”

O papel atual do gerente

Hoje em dia, o papel do gerente ainda está em constante revisão e suas atribuições variam de acordo com o nível hierárquico, especialidade, tamanho da empresa, conjuntura econômica e também com seus próprios valorespersonalidade.

Porém, existe um conceito bem atual e abrangente, elaborado por Josh Kaufman, que descreve o gerenciamento, basicamente, como o ato de coordenar um grupo de pessoas para atingir uma meta específica ao mesmo tempo em que se leva em consideração a inevitável mudança e incerteza.

Os “deveres” de um gerente, propostos por Kaufman, são muito distintos daqueles citados por Fayol décadas atrás e possuem intrinsecamente uma carga histórica de anos e anos de evolução:

  1. Recrute o menor número de pessoas possível capaz de alcançar a sua meta rapidamente e com alta qualidade.
  2. Comunique claramente o resultado final desejado, quem é responsável pelo quê e a situação atual do projeto.
  3. Trate as pessoas com respeito.
  4. Crie um ambiente onde todos possam ser o mais produtivos possível e saia do caminho, deixando que as pessoas trabalhem.
  5. Evite expectativas infundadas referentes à certeza e previsões.
  6. Mensure para verificar se a sua linha de ação está funcionando, caso contrário, tente outra abordagem.

Entendo que tais deveres sintetizam muito bem as atribuições atuais de um gerente. Mas acredito também que, conforme vimos em outra ocasião, vale acrescentar um sétimo dever: elimine as Barreiras da Colaboração que a gestão descentralizada pode trazer.

Para finalizar

Ao observarmos o papel do gerente moderno, atribuído por Kaufman, percebemos que ele carrega consigo muitos conceitos dos autores que citamos anteriormente:

Herdamos de Fayol os conceitos de Execução, Controle e Direcionamento de Recursos. Barnard nos ensinou sobre Autonomia e Cultura, Mintzberg destacou a Comunicação e a Tomada de Decisões como atribuições-chave do gerenciamento, e Bennins e Naus evidenciaram a importância do gerente para transformar visão em realidade.

Tudo isso e, certamente, muitas outras contribuições que não foram citadas aqui formaram a definição ideal de gerenciamento que sabemos hoje.

Conhecer um pouco dessa evolução histórica, nos dá uma visão muito mais ampla para entendermos melhor o contexto em que os gerentes estão inseridos. Conseguimos compreender as diferenças entre gerações e linhas de pensamento de cada um.

Isso nos deixa preparados para avançar mais um passo e discutir as melhores abordagens da atualidade. Por isso, no próximo post, vamos investigar quais são as principais práticas do gerenciamento moderno.

 

Referências: O Livro dos Negócios, diversos autores, 2014. Gerenciamento da Rotina, Vicente Falconi, 2013. O Lado Difícil das Situações Difíceis, Ben Horowitz, 2014. O MBA da Vida Real, Jack Welch e Susy Welch, 2015. O Manual do CEO, Josh Kaufman, 2012. Administração teoria, processo e prática. Idalberto Chiavenato, 2015. Teoria Geral da Administração, Antonio Cesar Amaru Maximiano, 2012.

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