Como o propósito ajuda as equipes a se motivarem?
Quando falamos de Liderança na Era Pós-Digital, encontramos um conjunto de insights que pode ser utilizado na gestão de pessoas em ambientes de constante mudança. O primeiro deles foi: Crie um propósito. Confesso que não fiquei satisfeito em ter apenas um comentário tão curto sobre um tema tão vasto. Por isso, decidi pesquisar um pouco mais sobre a importância do propósito na motivação de equipes.
A surpreendente verdade sobre o que nos motiva
Antes de qualquer coisa, precisamos entender a motivação em um aspecto mais amplo. No post sobre a Teoria do Incentivo, já abordamos o tema de maneira introdutória. Hoje, vamos explorar conceitos citados por Dan Pink em uma apresentação chamada Drive, a qual mostrou dados de pesquisas que vão ajudar a entender um pouco mais sobre o assunto.
A primeira constatação já aborda o que parece mais óbvio como incentivo, o dinheiro. Pink explora a descoberta de que, em tarefas envolvendo apenas atividades mecânicas, os pagamentos proporcionais funcionam como o esperado, ou seja, quanto maior a recompensa, melhor a performance. Porém, quando se adiciona alguma habilidade cognitiva, as coisas nem sempre funcionam da mesma maneira.
Essa é uma grande preocupação no meio corporativo atual, pois muitos gestores, que geralmente não atuam no “campo de batalha“, enxergam a remuneração extra como único incentivo que efetivamente gera resultados. Porém, em ambientes complexos, muitas vezes, as necessidades das equipes são outras, como ferramentas que lhes permitam fazer suas tarefas com maior eficiência ou a eliminação de barreiras que lhes impeçam de fazer seu trabalho, por exemplo.
O professor de Stanford, Huggy Rao, costuma dizer que recompensas em dinheiro funcionam como ferramenta quando são ligadas à emoção. Caso contrário, funcionam como uma droga.
Não podemos negar que dinheiro também desperta a motivação. Se você não compartilhar os lucros com as pessoas, elas não estarão motivadas para o trabalho. A premissa é: pague às pessoas o suficiente para que a falta de dinheiro não seja um problema para elas – o que não é pouca coisa – mas saiba que, de acordo com Pink, existem outros fatores que resultam em melhores performances e maior satisfação pessoal:
- Autonomia: O desejo de ser auto orientado.
- Maestria: O impulso do aprimoramento.
- Propósito: A busca por significado.
Esses fatores são muito claros quando observamos o mundo à nossa volta. Se o dinheiro fosse a única motivação, as pessoas não se dedicariam tanto a fazer coisas de graça em seu tempo livre, como treinar um instrumento, uma arte, um esporte ou ainda, algum hobby mais moderno, como escrever um blog ou “upar” um char em algum jogo online qualquer, durante horas, dia após dia. Também não veríamos tantos exemplos de pessoas que abandonam carreiras muito bem remuneradas para ter uma vida mais balanceada.
O vídeo abaixo ilustra (literalmente) a palestra de Dan Pink e traz outros exemplos. Vale a pena assistir.
Descobrindo o seu Propósito
“O dinheiro pode nos comprar comida, mas não o apetite. Remédios, mas não a saúde”
Henrik Ibsen
Na década de 60, o presidente dos EUA, John F. Kennedy, visitou a sede da NASA. Enquanto caminhava pelos corredores para conhecer as instalações, viu um homem caminhando com um balde e um esfregão. Kennedy foi ao seu encontro, se apresentou e perguntou: “Qual é o seu trabalho aqui?“. O homem, que claramente era da área de limpeza, respondeu prontamente: “Estou aqui para ajudar a colocar um homem na lua, Sr.“.
Essa história já foi contada algumas vezes por ser um excelente exemplo de propósito no trabalho. Afinal, aquele homem sabia que a sua função de manter os corredores limpos fazia parte de algo muito maior.
Mas quem deve ser o responsável por criar esse tipo de mentalidade no funcionário? Ele mesmo ou a empresa?
“Pelo que tenho visto, um verdadeiro senso de propósito é criado por ambas as partes. Por um lado, a organização deveria ajudar os funcionários a conectar o trabalho que estão fazendo com o impacto que estão criando. Para isso, deveria fazer coisas como compartilhar histórias, reuniões com clientes ou com a comunidade e criar oportunidades de crescimento. Pelo outro lado, o funcionário não pode simplesmente aparecer para trabalhar acreditando que será mimado e terá todas as suas necessidades atendidas. Ele precisa chegar ao trabalho com uma mente aberta, procurando maneiras de colaborar, aprender, crescer e, acima (e talvez antes) de tudo, saber porque está trabalhando para aquela empresa”
Jacob Morgan
A conclusão de Jacob Morgan para o Inc.com, me parece muito sensata. Não adianta uma empresa apenas declarar o seu propósito se os funcionários não souberem como podem impactá-lo. Seria criada, dassa forma, uma indesejada sensação de impotência. Não podemos também achar que tudo são flores. Quando uma empresa declara um propósito a ser seguido por todos, os funcionários querem saber o que vão ganhar com isso.
Quanto ao ponto de vista do funcionário, Dan Pontefract, em um artigo para HBR, resume em três tópicos os motivos de um funcionário trabalhar para uma empresa:
- Job Mindset – Mentalidade orientada pelo pagamento. Faz as suas obrigações esperando compensação financeira como retorno e nada muito além disso.
- Career mindset – Essa mentalidade acontece quando um indivíduo tem mais foco em avançar na carreira. Sua orientação é por promoções, reconhecimento, títulos, poder, tamanho da responsabilidade e esfera de controle.
- Purpose mindset – Paixão, inovação e comprometimento são características dessa mentalidade. Seu propósito profissional está alinhado com seu propósito pessoal.
Claro que tais mentalidades não são permanentes. A volatilidade da vida de cada um e as mudanças na organização fazem com que o foco dos funcionários se alterne constantemente. Porém, passar muito tempo focando apenas em salário e/ou carreira pode ser destrutivo:
- A empresa perde, pois funcionários com essa orientação também deixam o propósito da empresa em segundo plano, assim como a preocupação com qualidade ou a satisfação do cliente, por exemplo.
- O funcionário perde, afinal, em algum momento ele acaba ficando insatisfeito com um trabalho sem propósito e passa a sentir aquela enorme angústia quando escuta a chamada do Fantástico no domingo à noite.
A falta de propósito é muito mais danosa do que se imagina. Um estudo publicado pela SAGE Journals mostrou que pessoas que demonstram ter algum propósito na vida reduzem em 15% o risco de morte. No trabalho isso não é diferente, o filósofo Mario Sérgio Cortella explica a insatisfação causada pela falta de propósito em seu livro “Qual é a Tua Obra?”:
“Obra. Aquilo que faço, que construo, em que me vejo. A minha criação, na qual crio a mim mesmo na medida em que crio o mundo. Vejo o meu filho como minha obra, vejo um jardim como minha obra. Tenho de ver o projeto que faço como minha obra. Do contrário, ocorre o que Karl Marx chamou de alienação: todas as vezes que eu olho o que fiz como não sendo eu ou não me pertencendo, eu me alieno. Fico alheio. Portanto, eu não tenho reconhecimento. Esse é um dos traumas mais fortes que se tem atualmente.
Todas as vezes que aquilo que você faz não permite que você se reconheça, seu trabalho se torna estranho a você. As pessoas costumam dizer “não estou me encontrando naquilo que eu faço”, porque o trabalho exige reconhecimento – conhecer de novo.
Por que um bombeiro, que não ganha muito e trabalha de uma maneira contínua em algo que a maioria de nós não gostaria de fazer, volta para casa cansado, mas de cabeça erguida? Por causa do sentido que ele vê no que faz. Por causa da obra honesta, a serviço do outro, independentemente do status desse outro.”
Mário Sérgio Cortella
Propósito para as novas gerações
Como vimos, empresa e funcionários têm muito a ganhar, se encontrarem propósito em seu trabalho. Mas, isso ainda pode parecer estranho para gerações que viveram em uma época que a segurança e o sucesso tinham correlação direta com ganhos financeiros. Karl Moore, em um artigo para Forbes, escreveu sobre esse fato:
“Nos anos 80 e 90, muitos dos executivos de colarinho branco do mundo financeiro, como eu mesmo, eram motivados por bonificações. Muitos de nós trabalhavam duro para aumentar os patamares de remuneração. Nossos ganhos geralmente definiam nosso valor e nossas vidas.
Avance duas décadas e você perceberá que os jovens estão preocupados com outras coisas. Dinheiro ainda é importante e eles gostam de ganhar, no entanto, eles querem fazer parte de algo maior que eles mesmos. O trabalho não os define no mesmo grau que definia a mim e os colegas de minha época. Os jovens de hoje querem uma vida balanceada, Eles querem ser felizes em casa e no trabalho, dinheiro é algo secundário”
Karl Moore
Moore compartilha alguns insights sobre a relação dos jovens de hoje com o trabalho – ou millennials, como é conhecida essa geração -que será a maioria da força de trabalho em alguns anos:
- Dar um propósito para os jovens funcionários fará com que eles contemplem um futuro dentro da organização. Caso contrário, eles vão procurar outra empresa.
- Os millennials precisam de direcionamento e significado, uma mistura interessante de altruísmo e egoísmo.
- São mais leais ao trabalho do que ao empregador. Aprenderam com seus pais que quando uma empresa vai mal, não vai hesitar em demitir alguns funcionários.
- Organizações que querem prosperar no futuro precisam dedicar mais tempo em buscar um significado no trabalho. Ter um propósito definido e a oportunidade de impactá-lo trarão aos millennials a satisfação do sentimento genuíno de que eles estão fazendo do mundo um lugar melhor.
Para concluir
No final das contas, quando falamos de propósito no trabalho, nos referimos ao valor que criamos para a sociedade. O lucro é consequência disso, assim como o crescimento. Ian Brooks nos dá alguns exemplos:
O propósito da Sony, por exemplo, é “experimentar a alegria de avançar e aplicar a tecnologia em benefício do público“. De forma similar à HP, que se propõe a “fazer contribuições técnicas para o avanço e o bem estar da comunidade” e a 3M que tem por objetivo”resolver problemas não resolvidos, de forma inovadora“.
A Mary Kay cosméticos focaliza sua atenção em dar oportunidades ilimitadas para as mulheres e Henry Ford lutou para democratizar o automóvel. Sam Walton construiu o Wal-Mart para dar às pessoas comuns a chance de comprar as mesmas coisas que as pessoas ricas e Walt Disney era voltado a fazer as pessoas felizes.
Para quê a sua empresa existe? Por que você faz o que faz? Ter um propósito bem definido te faz levantar da cama e dar o melhor de si, todos os dias. Encontre o seu! Depois, encontre-o novamente! Dizem que a vida é curta demais, mas uma vida com propósito é suficiente.
“Ser o homem mais rico do cemitério não me interessa. Ir para a cama à noite sabendo que fiz alguma coisa maravilhosa é o que importa para mim.”
Steve Jobs
Referências: Who’s Responsible For Creating Your Sense Of Purpose At Work? Inc.com (link). Purpose in Life as a Predictor os Mortality Across Adulthood. SAGE Journals (link). You’re Never Done Finding Purpose at Work. HBR.com (link). Millennials Work for Purpose not Paycheck. Forbes.com (link), Acesso em março de 2017. Ganhando Mais, Ian Brooks, 1997. Qual é Tua Obra?, Mário Sérgio Cortella, 2013