Metodologias de Inovação – Design Thinking e a Empatia
Em 2009, Dev Patnaik, fundador e diretor de uma empresa de consultoria em inovação dos Estados Unidos, recebeu o pedido de um de seus editores para escrever um livro sobre inovação. Em vez de aceitar prontamente, decidiu fazer uma contraoferta. Segundo ele, já havia livros e artigos demais sobre o tema e o que o mundo precisava naquele momento era discutir sobre empatia.
Ao longo de anos trabalhando com algumas das empresas mais importantes do mundo, Patnaik chegou a uma conclusão: “Se existe uma coisa que aprendi em todo esse tempo é que as empresas prosperam quando conseguem criar empatia com o mundo ao redor delas“.
Humanos são seres sociais. Nosso sistema límbico faz com que sejamos curiosos sobre os sentimentos dos outros. A habilidade de empatia é o que nos separa de criaturas menos desenvolvidas, o que nos permitiu comunicar e colaborar com os outros e garantir nosso sucesso como espécie. Mas, nos últimos anos, parece que paramos de dar tanta importância para isso.
“O capitalismo moderno lutou sistematicamente para suprimir nossa necessidade de conexão com outras pessoas. Gestores e economistas encorajam as pessoas a olharem para os dados, não para as pessoas. Há um custo tangível nisso. Por meio do nosso foco em fatos e dados, podemos ter criado, acidentalmente, uma geração inteira de profissionais que acreditam que ter quatro ou cinco tópicos interessantes em um slide de Power Point, seja suficiente para entender o seu negócio. Eles perderam a noção de que negócios não acontecem no papel, mas no mundo real.
Todo negócio é pessoal. Pessoas, não máquinas, movem o motor do capitalismo. São elas que compram e usam produtos e serviços. Não importa se você está vendendo ursos de pelúcia ou motores de avião, sua empresa pode se beneficiar de um entendimento mais profundo dos consumidores que transcende os dados explícitos”.
Dev Patnaik
O consumidor não pode ser visto como um simples objeto de análise ou, pior ainda, como o desafortunado alvo de estratégias predatórias de marketing. As fronteiras que separam a empresa do mundo exterior estão começando a sumir. “Não é mais uma questão de ‘nós contra eles’ nem de ‘nós em nome deles’. Para o design thinker, deve ser uma questão de ‘nós com eles’“. (Tim Brown). No setor de calçados esportivos da Nike, por exemplo, a maioria dos funcionários é praticante de algum esporte.
Essa é a grande sacada do Design Thinking. O método volta nossa atenção ao ser humano. A empatia “nos faz pensar nas pessoas como pessoas e não como ratos de laboratório ou desvios padrão. É a tentativa de ver o mundo através dos olhos dos outros, de compreender o mundo por meio das experiências alheias e de sentir o mundo por suas emoções” (Tim Brown).
Aprender a nos colocar no lugar dos outros antecipa tendências e nos ajuda a entender o que o cliente precisa e, muitas vezes, ainda não sabe. Se não fizermos isso, só nos resta esperar o próximo estudo sobre Marketing Trends e ter a certeza que ficamos para trás.
Como criar empatia?
Felizmente, existem algumas ferramentas que ajudam a nortear essa tarefa. Elas estão separadas em três ações: Imergir, Observar e Engajar e possuem duas motivações centrais:
- Descobrir necessidades dos usuários, implícitas e explícitas, que possam ser exploradas no processo de design.
- Entender o cliente para saber em qual problema deveríamos trabalhar.
Imersão
A primeira ação é se colocar no lugar do cliente na prática, ou seja, passar por tudo o que o usuário passa. Um ótimo exemplo de imersão é o de Kristian Simsarian. Seu objetivo era descobrir os problemas no processo de atendimento de um pronto socorro. Fingindo ter machucado seu pé, Kristian se colocou na pele de um paciente.
Ele viu, em primeira mão, como o processo de cadastro pode ser confuso. Vivenciou a frustração de ser instruído a esperar, sem entender muito bem o porquê. Passou pela ansiedade de ser levado em uma cadeira de rodas por um funcionário não identificado em um longo e intimidador corredor, chegando a uma sala marcada por um forte ruído e luzes ofuscantes.
Após ter feito toda a Jornada do Cliente, Kristian identificou várias oportunidades de melhorar a experiência do paciente. O mais relevante é que ele entendeu que os detalhes mais fundamentais não eram a eficiência do pessoal ou a qualidade das instalações, como havia imaginado. Percebeu que o tédio e ansiedade faziam com que uma situação estressante, ficasse ainda pior. O pronto socorro havia sido projetado em função dos requisitos dos funcionários do hospital e não do conforto do paciente.
Esse é um ótimo exemplo de que não sabemos qual é o real problema sem utilizar a empatia. Talvez o pronto socorro tenha razão em não pensar no conforto do paciente em primeiro lugar. Mas sem fazer a imersão no processo, não teriam condições de fazer essa reflexão.
Observação
Essa ação é de compreensão mais fácil, porém, tão importante quanto as demais. Ao observar clientes interagindo com a empresa, você consegue percepções valiosas, sem gastar fortunas com pesquisas. Para facilitar, pense nas seguintes questões:
- O que a pessoa está fazendo? Perceba o que está acontecendo com ela e com todo o contexto em que ela está inserida. Faça anotações objetivas, anote desde as coisas mais óbvias até as mais surpreendentes.
- Como ela está fazendo? Considere que está descrevendo toda a situação para alguém que não está vendo o que acontece. O usuário está com pressa? Está nervoso? Parece cansado? Anote tudo.
- Por que ela está fazendo dessa forma? Tente deduzir a sua motivação, crie uma história e depois pergunte. Você certamente terá algumas surpresas, mas poderá confirmar muitas das suas deduções.
A observação é de longe a ação que mais vai lhe afetar. Quando treinamos nossa mente para observar comportamentos e processos, passamos a ver qualquer atividade com outros olhos. Ficamos atentos a identificar problemas e oportunidades em qualquer ambiente ou situação.
Engajamento
Chegamos à ação mais técnica de todas. Precisamos interagir com o usuário para compreende-lo de uma maneira mais profunda. Afinal, você pode observar duas pessoas em um processo exatamente igual e perceber que um deles ficou satisfeito e o outro não. As pessoas estão envolvidas em um contexto único, com motivações, aspirações e sentimentos absolutamente diferentes umas das outras.
Um alto executivo de 60 anos, fazendo o check-in em um hotel, depois de mais de 20 horas de viagens, entre avião e táxi, certamente terá uma noção de tempo diferente de um jovem casal passando férias. Por isso, precisamos conhecer melhor nossos clientes e validar o que as observações nos disseram.
A melhor forma de fazer isso, é estabelecendo uma conversa franca com usuários assíduos do seu setor. Para isso:
- Tenha um plano. Faça um brainstorm com sua equipe para entender quais são os objetivos, quais os usuários que devem ser abordados e descubra quais são as perguntas que valem a pena ser respondidas. O tempo com o usuário é valioso, aproveite.
- Sempre faça essas entrevistas em dupla, assim, um dos participantes faz anotações enquanto o outro garante a fluidez da conversa.
- Solicite uma conversa curta com pessoas que acabaram de experimentar a Jornada do Cliente. Olhe no olho, se apresente e deixe claro seus objetivos. Faça com que as pessoas se sintam confortáveis e seguras.
- Ao interagir com o usuário, você ainda não está tentando resolver um problema. Seu objetivo agora é entendê-lo melhor e descobrir o que é realmente importante para ele, não necessariamente o que é importante para a sua empresa.
- Entenda quais são as emoções envolvidas, a sua tarefa é ir além. Entenda as reais necessidades dos clientes para depois definir qual é o problema que você tem.
- Um roteiro pode lhe dar mais segurança no momento da conversa. Um guia desenvolvido por Stanford sugere que os seguintes aspectos sejam explorados nessa ordem: 1.Se apresente; 2.Apresente seu projeto; 3.Construa conexão entre vocês; 4.Estimule-o a contar histórias; 5.Explore emoções; 6.Faça perguntas e considerações finais; 7.Resuma a conversa em alguns tópicos e agradeça.
Esse é um bom começo. Quando estabelecer esse tipo de contato, vai perceber facilmente quão importante é esse processo. Por outro lado, vai sentir um certo desconforto em algumas situações por falta de prática. Para acelerar o processo de aprendizado, seguem algumas dicas para aprimorar a sua técnica:
- Pergunte “por que?” – Mesmo quando você achar que sabe a resposta, pergunte o porquê estão dizendo ou fazendo algo.
- Nunca diga “normalmente” ao fazer uma pergunta – É melhor perguntar sobre um exemplo específico como: “Me fala da última vez que você…?”
- Encoraje histórias – Sendo verdadeiras ou não, as histórias revelam como as pessoas veem o mundo.
- Procure por inconsistências – Algumas vezes as coisas que as pessoas fazem e dizem são diferentes.
- Preste atenção nas dicas não verbais – Fique atento a linguagem corporal e emoções.
- Não tenha medo do silêncio – Geralmente tentamos fazer uma pergunta imediatamente após uma resposta. O silêncio pode fazer o cliente se aprofundar mais no tema.
- Não sugira respostas às suas perguntas – Mesmo que o cliente não saiba como iniciar uma resposta, não faça sugestões.
- Não faça perguntas binárias – Elas podem ser respondida com apenas uma palavra e você não consegue estabelecer um diálogo dessa forma.
- Utilize no máximo 10 palavras por pergunta – O cliente pode se perder.
- Faça apenas perguntas direcionadas e uma de cada vez – Você não quer pressionar ou confundir o cliente.
- Esteja preparado para captar as respostas e insights – Se não tiver um colega para fazer as anotações, grave a conversa. É impossível engajar um cliente e anotar suas respostas ao mesmo tempo.
A empatia faz parte da etapa de Observação do Usuário do Design Thinking. Os passos seguintes, bem como os anteriores, podem ser encontrados no primeiro post da série Inovação na Prática.
Para concluir
Todas as vezes que utilizei esse tipo de abordagem, seja por compromissos acadêmicos ou profissionais, tive grandes surpresas e revelações. Traga essa ferramenta para os seus projetos, não se intimide em conversar com o cliente, as lições que você irá aprender são muito mais relevantes do que qualquer insegurança.
Os melhores insights, em toda o complexidade do mundo dos negócios, estão bem na nossa frente, guardados naquelas pessoas que interagem diariamente com nossos canais de atendimento e absolutamente interessadas em melhorias que facilitem sua vida. Nos resta descobrir as melhores formas de garimpar essas oportunidades. Usemos a empatia, que, além de tudo, nos aproxima da nossa própria humanidade.
Referências Empatia: Innovations Starts With Empathy, Dev Patnaik (link). Design Thinking, Tim Brown, 2010 Stanford Innovation and Entrepreneurship Certificate. Stanford (link)
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