O encantamento como força motriz.
Maio de 1991, a escola que frequentava, em Serra Negra – SP, estava realizando diversas ações para comemorar o dia do trabalho, eu tinha 7 anos e mal sabia como o mundo dos adultos funcionava. Uma das ações da escola foi levar todos os alunos da classe para conhecer o trabalho dos pais de cada um, fomos conhecer padarias, escritórios e outros trabalhos muito empolgantes para uma criança vivendo em uma cidade tão pequena. A visita mais esperada pela molecada era conhecer o trabalho de um pai policial e, quando esse dia chegou, nossas expectativas foram atendidas, andamos de viaturas, com direito a sirene ligada e tudo, o que nos fez sentir em um filme de ação, conhecemos algumas celas, que, embora estivessem vazias, traziam a assustadora realidade de viver preso, as contagens de dias rabiscadas nas paredes davam um clima sensacional, estávamos muito empolgados.
O dia para conhecer o trabalho do meu pai estava chegando, ele tinha um trabalho incrível, trabalhava com comercio exterior e com todos aqueles produtos e navios vindos do outro lado do mundo, mas eu estava receoso, afinal, ele trabalhava em Santos e voltava à nossa cidade apenas aos finais de semana para ficar conosco. A visita seria em minha casa, impossível superar a visita à delegacia, até a visita à padaria poderia ser considerada uma aventura, se comparado ao que estava por vir.
Mas meu pai nunca se contentou em apenas atender expectativas.
Quando chegamos à minha casa, todos os meus colegas estavam entediados, conhecer uma casa não era lá grande coisa. Logo que entramos, fiquei confuso, muitos dos meus brinquedos estavam em cima da mesa e meu pai estava lá, com um enorme sorriso nos aguardando. Ele usou meus brinquedos para simular todo o processo de seu trabalho, desde a negociação, passando pela logística, despacho e a entrega das mercadorias, sua narrativa era empolgante e cativante, todos os meus colegas estavam de olhos arregalados, esperando ansiosos pelo próximo passo de todo aquele esquema diligentemente planejado em cima de uma mesa de jantar.
Eu não conseguia tirar os olhos dele, tudo que eu conseguia pensar era em ser como meu pai. Já o vi desolado, olhando sua esposa e filhos tomarem um ônibus para voltarem pra casa, enquanto ele tinha que ficar mais uma semana longe, já o vi cansado, estressado e até se sentindo derrotado, mas é até hoje a pessoa mais bem sucedida que conheço, obteve sucesso como pai, esposo, profissional e ainda consegue colocar magia em tudo que se propõe a fazer.
Essa foi uma lição muito importante pra mim, tento buscar uma forma de encantar as pessoas em tudo que faço. É claro que nem sempre é possível, afinal, existem muitos obstáculos como prazos, orçamentos, cansaço, críticas… Mas isso, só faz reduzir as expectativas das pessoas, o que aumenta sua chance de supera-las.
Então, quando se propuser a fazer algo, que seja para fazer olhos brilharem e queixos caírem, que seja para encantar todos à sua volta e fazer alguma diferença na vida de alguém, como meu pai fez com aquele punhado de crianças, que ainda passaram muito tempo falando sobre a melhor visita do mês do trabalho, enquanto meu orgulho só aumentava.